terça-feira, 16 de junho de 2009

EZLN e FSM [enxames]


Investiga-se a utilização do mecanismo informacional como suporte de movimentos e organizações sociais em rede. Não se trata de interpelar as técnicas capazes de ‘desarmar’ um sistema informacional como em uma infowar, ilustradas pelas práticas militares norte-americanas nos Bálcãs. Trata-se, ao contrário, de compreender os meios de comunicação e informação como ‘armas’ políticas, democráticas. Primeiramente, Scherer-Warren, em seu livro intitulado “Redes de Movimentos Sociais”, não deixou de definir os grassroots [movimentos de base] que foram, desde as décadas de 1970-80, parte da multiplicação das comunidades eclesiais de base e suas pastorais cristãs, mas caracterizou as networks [redes de movimentos] que se formam no Brasil por quatro princípios comuns: articulação dos atores e movimentos sócio-culturais; transnacionalidade; pluralismo organizacional e ideológico; atuação nos campos cultural e político. Neste mesmo período, a partir da década de 1970, houve a transição fordista para a produção pós-fordista, em que as técnicas e as organizações da produção industrial transferiram-se para unidades produtivas menores e móveis, isto é, para estruturas de produções mais flexíveis. Não é forçoso afirmar que, a partir de então, as redes de informação, comunicação e cooperação vão passar a definir os novos movimentos guerrilheiros. As forças guerrilheiras policêntricas serão compostas por numerosos focos independentes, onde não existe um centro, mas uma pluralidade de ‘nós’ em comunicação uns com os outros.

O ataque em rede foi descrito por Hardt e Negri em seu livro “Multidão” como uma multiplicidade de atacantes irracionais, desconhecidos, incertos, invisíveis e inesperados. Uma rede disseminada ataca o inimigo como um ‘enxame’, ou seja, inúmeras forças independentes atacam em todas as direções um ponto específico e em seguida desaparece do ambiente. O ataque em rede se apresenta como um enxame, porque ele parece informe. Deduz-se do conceito de enxame, afinal, o comportamento coletivo de animais sociais que investigam sistemas de inteligência disseminados com múltiplos agentes – a inteligência do enxame baseia-se, pois na comunicação. Essa forma de inteligência coletiva pode surgir da comunicação e da cooperação. Os enxames surgem como novas organizações políticas em rede e compõem-se por uma multidão de diferentes agentes criativos em torno da sexualidade, raça, etc. Não se trata de uma evolução natural das formas de resistência, mas não se pode deixar de observar, ao longo do século XX, sucessivas organizações de movimentos e lutas que partiram dos exércitos populares [cubano, maoísta], os bandos de guerrilheiros urbanos [Panteras Negras, tupamaros uruguaios, Facção do Exército Vermelho alemão, as Brigadas Vermelhas italianas] e os movimentos em rede [Exército Zapatista de Libertação Nacional e Fórum Social Mundial].

O Exército Zapatista de Libertação Nacional [EZLN] foi um pivô entre o velho e o novo modelo estrutural de movimentos guerrilheiros em rede. Os zapatistas usam a internet para distribuir os comunicados e alcançar tanto o nível nacional quanto o global. Enfatizam a necessidade de se criar organizações horizontais em rede, em vez de estruturas verticais e centralizadas, como nos exércitos ocidentais, mesmo assim os zapatistas compõem seu exército com uma série de títulos e patentes, resulta daí a emblemática posição rotativa apresentada como um esvaziamento de autoridade no centro: Marcos sinaliza, então, com a patente de subcomandante, a sua relação de subordinação, através de uma meta em que se procura mudar o mundo, mas sem tomar o poder. Os movimentos anti-globalização de Seattle, Gênova e o FSM constituem, portanto, o mais claro exemplo de organizações em rede. Os movimentos anti-globalização não são ilimitados, eles protestam contra o complexo carcerário-industrial e se constituem como o mais avançado movimento de organização em rede. A estrutura disseminada em rede é um modelo democrático de uma poderosa arma contra estruturas capitalísticas de poder, enfim, tende-se a não criar um centro de comando, ao mesmo tempo em que se busca maximizar a autonomia dos elementos componentes. A globalização como ‘retórica neoliberal’ tornou-se uma força importante na década de 1990, como demonstrou Immanuel Wallerstein em seu livro “O Declínio do Império Americano”, cujo foco midiático era o Fórum Econômico Mundial de Davos, promovido pelo Consenso de Washington através das políticas do FMI e do fortalecimento da OMC. Depois dos protestos nos encontros da OMC em Seattle em 1999, uma série de manifestações continuaram pelo mundo contra a ‘agenda neoliberal’, que levou à construção do Fórum Social Mundial, que procura reunir tanto a velha esquerda quanto grupos organizados de forma estritamente local, regional e transnacional. Percebe-se, portanto, que o uso adequado dos meios de comunicação e informação pode servir para a organização menos centralizada dos grupos e mais horizontalizada. Um novo paradigma democrático irrompe-se, toda vez que a liberdade de expressão deixa de estar apenas a serviço dos profissionais da comunicação, mas em proveito de todos. O que uma simples página da internet não pode fazer em tempos de guerra? Ainda não se sabe.

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