segunda-feira, 12 de outubro de 2009

A Micheletti, o Déspota em sua Tirania


... mas ele não se vê canibal, pois não está correndo no sangue de Honduras, mas ele a canibalizou. Comeu-a como quem come da própria carne. Ele não vê o sangue que escorre pelos hondurenhos, até porque foi ele mesmo quem o fez escorrer: é por um estado de violência permanente que o déspota pode impor sua vontade ao corpo social inteiro. O déspota é aquele que exerce fora do estatuto e fora-da-lei, mas de uma maneira intrincada com a sua existência mesma. O déspota impõe de uma maneira criminosa seu interesse. Como fora-da-lei, o déspota é um indivíduo sem vínculo social. O déspota é o homem só.

Michel Foucault definiu, em seu curso "Os Anormais", o déspota como aquele que efetua o crime máximo: o crime da ruptura total do pacto social, pacto pelo qual o próprio corpo da sociedade deve existir e se manter. O déspota é aquele cuja existência coincide com o crime.

Há uma espécie de simetria ou de parentesco entre o criminoso e o déspota, pois são dois indivíduos que desprezaram ou romperam com o pacto fundamental, fazem de seu interesse a lei arbitrária que querem impor sobre os outros. Duport, em 1790 discutiu sobre o Código Penal: "O déspota e o malfeitor perturbam, um como o outro, a ordem pública. Uma ordem arbitrária e um assassinato são crimes iguais, a nosso ver". O velho tema do vínculo entre o soberano acima das leis e o criminoso abaixo das leis, desses dois fora-da-lei, encontrado bem antes da Revolução Francesa.

Tendo suportado por algum dia o peso do poder do déspota como indivíduo, e não como corpo social, a população terá de se livrar dele. A esse fora-da-lei: qualquer um pôde matar o rei!

Dizia Saint-Just: "O direito dos homens contra a tirania é um direito pessoal".

Qualquer coisa sobre a lei, o direito e Constituição em Honduras diz-se:

Não se é tiranizado senão pela lei, segundo Gilles Deleuze em seu livro “Sacher-Masoch”. As paixões de meu vizinho são infinitamente menos temíveis que a injustiça da lei, pois as paixões desse vizinho são contidas pelas minhas, enquanto nada impede, nada contraria as injustiças da lei.

Só se é tirano pela lei: a tirania só prospera pela lei. Nunca é na anarquia que nascem os tiranos, só os vemos nelas se autorizando. É o nosso ódio contra o tirano, por isso mostramos que a lei torna possível o tirano, que fala a linguagem da lei e não possui outra linguagem.

Estamos prontos para uma antitirania hondurenha e falamos a língua de Sade como nenhum tirano poderia falar.

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