domingo, 22 de março de 2009

Fascínio Fascista [Pop-politik]

Há diversas formas de Estados: totalitários, ditatoriais, soviéticos, do clássico modelo Keynesiano às diversas práticas intervencionistas. Afora todas as atrocidades cometidas pelo Führer ou pelo Duce, Fascismo e Nazismo somente são conceitos que prefiguram imagens de líderes de Estados europeus no período entre guerras, entretanto essas imagens distorcem qualquer concepção coerente do 'Estado forte' e, mais, por sua violência, atualmente, parece até um crime pronunciá-las, mesmo com toda a acuidade em que se estudam essas formas de poder [em conferências e simpósios, nas salas de aula e nos laboratórios de pesquisa das universidades do mundo inteiro]. Por que, então, utilizar o 'fascismo', expressão tão polêmica e violenta na história mundial, como escopo geopolítico? Primeiramente, faz-se apenas aqui uma assimilação desse período específico da história, articulado com a atualidade política mundial. Em segundo lugar, questiona-se o comportamento das nações que escolhem e se identificam com seus líderes, em suma, acolhendo as intervenções estatais na economia. Afinal, a pergunta que tanto incomodou estrategistas, cientistas e psicólogos europeus não foi como a população européia desejou o nazi-fascismo? Nosso interesse é estritamente geopolítico, assim, não há desejo algum em ocultar essa fase da história mundial, a despeito de um discurso panfletário e politicamente correto. Compreendidas essas ressalvas, é certo que, para os capitalistas ou neoliberais, um perigo constante ameaça as 'instituições democráticas', toda vez que se constata a ampliação do avanço e do acesso das forças populares e minoritárias na política, em geral, estatisticamente comprovado pelo processo eleitoral. Perigo para quem? Resta saber. Plebiscitos, eleições e referendos acontecem com freqüência para desvendar a opinião popular e eleger os seus líderes. Um líder possui no mínimo duas características: de um lado, um estatuto jurídico definido por certos atributos, por exemplo, compartilhar a identidade nacional, possuir uma idade mínima, bons antecedentes, ser filiado a um partido político, isto é, toda uma trama de etapas cumpridas que dê a qualquer indivíduo o direito de se candidatar a um cargo público. De outro lado, um líder não se baseia apenas em seu estatuto jurídico, mas também no seu aspecto carismático, exatamente aquilo que possibilita que seguidores ou fiéis se aglomerem ao redor dos seus líderes, que respeitem as normas do grupo e se tornem reconhecidos entre si por determinadas asceses, práticas ascéticas, um ascetismo singular – um estilo de vida que deve ser compartilhado por todos os membros de um grupo que circundam um führer, um líder. Duplicidade do líder, corpo duplo do déspota, jurídico e carismático. Entretanto, é por seu carisma que um líder se torna ‘força de lei’, ou seja, sua fala se transforma em uma lei, aquilo que se diz deve servir como uma lei que deva ser cumprida, ‘lei viva’ que Agamben chama de nomos empsychos, em seu livro "Estado de Exceção". É certo que os regimes carismáticos possuem significações proféticas e que o estatuto jurídico se caracteriza por sua aparência sacerdotal. Caso aceitemos a diferença entre o profeta (como o indivíduo que fala a lei) e o sacerdote (aquele que interpreta a escrita, a lei). Trata-se do aspecto divino do poder, o contato do déspota com Deus de dois modos: num caso, é o próprio Deus que fala aos ouvidos do profeta, noutro caso, a renúncia e a interpretação dos textos sagrados, da lei, contemplam a exegese sacerdotal. Interroga-se, pois, como o poder carismático se relaciona com políticas fascistas.

Trata-se do nazifascismo, que foi desejado pelos povos e planejado pelas autoridades européias no primeiro quarto do século XX, em seus laboratórios ditatoriais alemães e italianos, eclodindo com as guerras mundiais. Destacam-se diversas análises científicas a respeito das origens do totalitarismo de Hannah Arendt; a concepção de dominação carismática de Max Weber; o pólo paranóico e gregário dos micro-Édipos ou micro-fascismos em Deleuze e Guattari; o lado místico do poder numa ‘captura mágica’ como Georges Dumézil compreendeu o Estado indo-europeu. Originalmente, entretanto, no imaginário ocidental ou no self europeu, observa-se uma demarché na Grécia Clássica que o governo dos homens acabou se estruturando em torno de uma verdadeira técnica, de acordo com Michel Foucault em seu livro "A Hermenêutica do Sujeito". Foi assim que Alcibíades aproximou-se de Sócrates, despreocupado com o lado jurídico de sua tentativa de governar Atenas. O que ele queria do filósofo era saber como governar os outros, já que era um eupátrida, possuía idade suficiente para governar, etc. Sócrates recomendava o cuidado de si a Alcibíades, afinal só cuida dos outros, aquele que cuida de si. Neste caso o que se percebe é uma ausência de técnica para governar em Alcibíades, mas que no filósofo grego é especificada como uma “técnica de si” e de uma “técnica de governar os outros”, técnicas que no pensamento foucaultiano designa ‘governamentalidade’. De outro modo, nas tribos primitivas sul-americanas, todavia, em seu livro "Arqueologia da Violência", Pierre Clastres definiu o papel estratégico das migrações xamânicas, que fazia toda uma população fugir, migrar do campo de ação dos poderes excessivos e tirânicos do chefe da tribo, ávido por guerra. Ressalta-se o campo de forças na política que resulta do estatuto místico, carismático do poder do xamã, opondo-se ao poder do chefe da tribo, pautado na linhagem, no aspecto ‘jurídico’ e legítimo do poder. Hipnotizando multidões, seja na Grécia, seja na Europa do Reich, ou ainda seja nas tribos sul-americanas, o 'fascínio fascista' [metáfora ainda inadequada] reside apenas nessas análises sobre o lado carismático e mágico das ações políticas.

A América Latina, atualmente, tornou-se locus preferencial dessa prática paternalista e protecionista de poder, cuja potência do Estado busca abarcar todas as relações sociais. Paternalismo das populações carentes e protecionismo dos fluxos de mercadorias, regulamentadas geralmente por projetos sociais e embargos econômicos. Na ótica da imprensa e dos argumentos opositores, Lula, Chávez, Morales, Noriega e Correa desfilam ‘tendências populistas de Estado, muitas vezes intitulando-se socialistas. Contudo, a versão norte-americana de Barack Obama é a mais fascinante detectada até agora pelas objetivas da mídia. Obama é um negro de pele, árabe na assinatura, com isso a representação minoritária atua na política norte-americana, após uma sucessão de presidentes que viviam a paranóia de guerra. O Estado volta a interferir na economia, por isso que estatizar torna-se, aos poucos, uma palavra de ordem. A população norte-americana vê-se desprotegida, desempregada, endividada, encurralada num cerco imposto pelas forças privadas e liberais. Os fundamentalismos e as ‘ondas tribalistas’ estacionam a onde o Estado enfraquece, assim nessas relações criam-se guetos, micro-fascismos (numa acepção deleuzeana). Muitas etnias, bandos e abandonados pelo regime capitalista, cada vez mais excludente. A maior potência do planeta mostra seu lado obscuro: a população que vive sob o medo, a insegurança; as crianças se armam nas escolas, elas muito cedo se tornam homicidas; as forças armadas recrutam jovens que vão parar em frontes de guerra; a polícia multa os cidadãos que não agem na norma e espancam gangues que brigam e disputam territórios. As diásporas espacializam a multiplicidade de costumes e hábitos de uma nação migrante. De repente, todo o consenso eleitoral destinou a Obama a responsabilidade de planejar uma política plural, atribuindo-lhe praticamente dons mágicos. Mesmo tarde, pelo menos em relação aos populismos que proliferam na América Latina, os Estados Unidos fabricaram seu recente líder. Talvez essa seja uma tradução dos sonhos de uma superpotência que se vê no meio de uma crise econômica complexa e intensa, ao mesmo tempo em que a indústria bélica pressiona a democracia através de uma violência irracional contra a diferença, marcando sua intolerância destrutiva. Deste modo, sem ter por onde fugir, a potência das massas fortalece a política.

Um comentário:

DoarATAT disse...

Com paciência e passar!
Universal verdadeiro: Se você quiser mudar algo, comece com você mesmo! "O resto é silêncio" (Schakespeare)
Recomendamos que você leia-se: Aïvanhov, Omraam Mikhael
Atenciosamente, os melhores!

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